sexta-feira, 18 de junho de 2010

Lados


Aos sons do piano ela inicia seu dia. Olhava pela janela lá fora, o dia extrapolando luzes. Às vezes mais desanimada, com os dedos calejados, com as melodias cansadas de repetir o seu árduo trabalho. Do condicional que se faz tão intenso, devemos sempre nos esforçarmos. A caminhada é eterna, enquanto dura. A competição é necessária. Ela nos dá uma motivação absurda para seguir novos passos, novos rumos. Quase falecia nos ápices das canções. Era tão pulsante e tão entregue ao seu suposto ofício, preferia chamar de hobbie. Ficava mais bonito, até mais erudito. Não entendia o sentido das músicas instrumentais. Apesar de tocarem em órgãos tão sensíveis do âmago, elas, ao mesmo tempo, não diziam nada. Uma solidão a abatia e procurava, mais uma vez, as canções alegres. Se sentia momentaneamente feliz. Mas ainda doía o som das más melodias que já produzira, em erros e mais erros. Mas pensou: o passado já constituiu o bom, tudo que sou hoje é graça as minhas falhas como pianista. Recomeçar novas melodias, reciclar algumas notas de algumas partituras antigas é sempre necessário. Até que um dia, deixou de olhar as luzes de fora e resolveu ser a própria luz diante da sua janela. E o fez.

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